Bem vindos a era da pós-verdade: manchetes precedem os fatos, memes superam argumentos e a indignação vale mais que a lógica. Tudo é verdade e mentira ao mesmo tempo, moldado por enquadramento e engajamento.
É fato: vivemos na era da pós-verdade, onde tudo é verdade — e, portanto, nada é. Onde a manchete vem antes dos fatos, o meme antes da argumentação, e, como dito anteriormente, a indignação vale mais que a lógica. Onde todo mundo está certo e errado ao mesmo tempo, e onde a realidade virou apenas uma questão de enquadramento e engajamento.
Quer um exemplo? Após a passagem do furacão Helene pela Flórida, uma imagem começou a circular nas redes: uma criança chorando em cima de um barco, abraçada a um cachorro, supostamente resgatada da enchente. Milhões de visualizações. Comoção instantânea. Políticos usaram a imagem como símbolo. O problema? A imagem era falsa. Gerada por IA. Com membros distorcidos e texturas borradas, típicas de uma geração artificial mal feita — e mesmo assim, o impacto emocional foi real. A senadora Amy Kremer, mesmo depois de saber que era fake, manteve a publicação e declarou: "honestamente, não importa. A imagem é emblemática do sofrimento."
Sabendo disso eu paro e penso, se Nietzsche vivesse hoje, teria tweetado: "Deus está morto, mas pelo menos dava pra conversar com ele pela fé. A verdade, essa vagabunda, nem DM responde."
Mas se a verdade está realmente morta, quem manda agora?
Se a verdade é relativizada, quem manda é o mercado. Porque o mercado não precisa de validação ideológica, ele apenas emerge da ação humana. Como Mises explica em Ação Humana, todo ser humano é motivado a sair de um estado de conforto menor para um de maior, e isso gera um movimento coletivo que chamamos de mercado. Toda ação gera lucro, seja ele emocional, pessoal, financeiro, para ambas as partes. Uma troca não é um jogo de soma zero, e sim um ganha-ganha. É por isso que o mercado parece o último sistema funcional em um mundo onde o valor moral foi dissolvido em likes, e a coerência se mede em convencimento de massa.
Mas o mercado, apesar de funcional, não é neutro. Ele reflete preferências, não necessariamente virtudes. Ele premia o que engaja, não o que edifica. Alguns podem argumentar que em tempos de atenção escassa, o algoritmo das redes sociais pode ser mais ditador que qualquer tirano de farda e a descentralização não garante lucidez, para isso precisamos entender o que de fato é o mercado.
O mercado é, conceitualmente, um sistema homeostático descentralizado. Homeostase, de forma clássica, é a capacidade de um organismo (ou sistema) de manter condições internas estáveis, mesmo diante de mudanças externas. Mas podemos ir além: a estabilidade real emerge da capacidade de se adaptar continuamente ao desequilíbrio.
Pense no corpo humano e no ciclo da insulina: você consome açúcar (estímulo), o pâncreas detecta (sensor), ajusta a produção de insulina (controle), e as células reagem absorvendo a glicose (efetor). Esse balanço constante entre insulina e glicose promove a vida como conhecemos.
O mercado faz o mesmo com recursos escassos, por meio de preços, demanda e oferta. Tudo se regula sem a necessidade de um planejador central. Basta que os participantes reajam aos sinais.
E aqui vou sair um pouco do tema do vídeo para mandar a real: o estado é a diabetes do mercado — uma falha crônica no sensor que atrapalha o controle fino do sistema. Intervém onde não entende, distorce sinais de preços, subsidia ineficiência e regula até o que não precisa respirar. Quando o pâncreas da liberdade começa a falhar, o corpo econômico inteiro adoece. Há quem diga que o estado pode ser o médico — mas geralmente ele é o paciente crônico com a seringa na mão errada.
Voltando ao tema central do vídeo: Enquanto ideologias brigam para definir o que é certo, o mercado simplesmente funciona, seja para recursos ou ideias. Indiferente à moral, à história e à narrativa — algo próximo ao funcionamento do método científico.
A ciência também é descentralizada, mas com outro objetivo: aproximar-se da verdade. Ela trabalha com verdades provisórias, sustentadas por consenso temporário e evidências acumuladas.
"Mas a ciência erra!" Sim, felizmente. É assim que se corrige. Toda teoria é uma aposta corajosa contra o desconhecido, que se torna confiável apenas quando sobrevive ao escrutínio. E quanto mais ideias opostas entram no ringue metodológico, mais forte sai o que sobrevive. É a seleção natural de ideias, a memética descrita por Dawkins. Verdade, aqui, não é dogma — é resultado de uma guerra fria de dados.
Em suma, nem toda ideia sobrevive por mérito. Muitas vencem pelo volume, pela repetição, pelo apelo emocional. A descentralização por si só não garante qualidade — apenas diversidade. E às vezes, essa diversidade é só ruído passageiro, sendo assim somente as ideias mais adaptáveis sobrevivem ao crivo temporal, fazendo com que o sistema como um todo tendencie para uma "verdade funcional", pense comigo:
Se a verdade absoluta é inalcançável, mas é possível criar consensos funcionais, então o que importa é a capacidade de um sistema de responder ao real de forma adaptativa. A descentralização da informação — esse fluxo constante de visões divergentes, tags, vídeos, threads, lives e provas instantâneas — torna o controle narrativo quase impossível. Toda tentativa de moldar a realidade por um único discurso colapsa diante da multiplicidade de testemunhas, é como se um libertário e um comunista ficassem cada vez mais afiados em suas linhas de raciocínio e técnicas de convencimento toda vez que se enfrentassem, mas como tudo depende de suas convicções pessoais, critérios emocionais e subjetivos, esse desequilíbrio nunca cessará: é o fim da frase: A história é escrita pelos vencedores.
Nesse novo cenário, cada indivíduo com um celular ou um computador é uma antena, uma câmera, uma contra-narrativa em potencial. Não existe mais monopólio sobre o que pode ser visto ou dito — tudo pode ser contestado, criticado, revelado e até mesmo zombado. Os memes zoando nosso ditador de estimação Xandão Cabeça de Piroca não são apenas deboche. São desmonte simbólico. O meme não argumenta — ele ridiculariza. E quando o poder vira piada, perde a mística. Ele se deteriora.
Isso cria um mercado de ideias hiperativo, onde a informação circula com brutal velocidade e onde as narrativas não condizentes com a realidade têm prazo de validade curto.
A própria estrutura do poder se transformou: antes sustentada pela autoridade da verdade, agora é corroída pela multiplicação de perspectivas. O mercado de ideias funciona como um sistema imunológico coletivo, onde o fluxo constante de informação descentralizada impede que "doenças narrativas" se espalhem sem resistência. Elas podem até convencer indivíduos, mas a malha como um todo se adapta e reage.
Vivemos numa estabilidade causada pelo caos informacional. Uma homeostase da mentira, da ironia, da sobrecarga. E no meio desse vômito de narrativas, o mercado segue operando como um dos últimos sensores verdadeiramente confiáveis de preferência real — não por autoridade, mas por arquitetura descentralizada.
Sistemas coercitivos, autoritários, centralizados — sejam de esquerda, direita ou delírio místico — são hoje inerentemente instáveis. A descentralização da informação não permite que uma mentira dure muito tempo. A coerência do discurso não aguenta o escândalo da prática.
Sendo assim, concluo que o sistema mais funcional neste momento histórico seja o que menos depende de narrativas unificadas: o mercado. Ele não precisa de verdades absolutas. Ele precisa de escolhas.
E quando tudo é mentira... a responsabilidade pelas nossas escolhas é tudo que nos resta.
Observação só coloquei a materia ali pq precisava de um link de noticia, mas só é uma anedota usada no texto e se possivel usa a capa do nietzsche estilo ghibli que gerei, ela é perfeita para o texto heheheh